segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Adeus

Dizias sempre alguma coisa que me deixava a pensar que conseguias ler a minha mente, e que de alguma forma, me conhecias melhor do que aquilo que eu queria que alguém me conhecesse. Metias-me medo porque apesar disso, usavas esse poder para me provocar, como se quisesses testar os meus limites e fazer de mim, só mais um individuo da tua amostra. Calavas o meu desconforto com um sorriso que te enchia a cara e me fazia sorrir de volta. Tinhas umas sardas que pareciam falar comigo e uns olhos com tanta energia que me furavam a alma, num rosto que me pareceu familiar assim que te vi. Talvez num sonho, numa premonição inconsciente da marca deixada pela passagem do teu sabor na minha vida.

- Aposto que não és capaz de sair do carro

Não é que não fosse capaz, mas apetecia-me ficar dentro do carro contigo. Nunca mais te vi e ainda bem que não saí naquela noite escura na serra. Acho que fomos para casa e fizemos amor, pelo menos eu, porque nunca percebi o que sentias por mim. Às vezes lembro-me de ti, havia qualquer coisa entre nós não achas?

- Vamos para o fim do mundo?

Nessa altura ia contigo para qualquer lado, acho que ainda não tinha havido chamadas sem resposta do outro lado, nem desculpas esfarrapadas que eu não queria contrariar, para não desperdiçar o pouco que tempo que me dispensavas. Lembro-me de te ter apanhado uma tarde à porta de casa e me apareceres com o cabelo ainda molhado, num sorriso que te disfarçava as sardas que falaram comigo. Vamos para o fim do mundo que hoje só me apetece estar sozinha contigo, sem um mar de gente a separar-nos, sem desculpas para dar nem perguntas para guardar.

- Não tínhamos combinado ir à praia ontem à tarde?

- Nem imaginas o que me aconteceu

No fim do mundo pus-te o apelido Lisboa, de cabelos louros em vez de negros como sempre a imaginara. Lembro-me que não achaste grande piada à minha metáfora apaixonada, e esboçaste um sorriso falso que fez as sardas fecharam-se num silêncio que me custou a digerir. Acho que nessa altura já tinha deixado de te tentar perceber, eras um fim anunciado que eu apenas tinha que aproveitar até o inevitável acontecer.

- Sai da minha casa!

Levantaste-te sem me olhar nos olhos e saíste porta fora, e lembro-me de ter sentido a tua falta assim que ela se fechou nas tuas costas. Ainda fui atrás de ti para ver se voltavas e te deitavas na cama a olhar para mim, de cara cheia pelo sorriso e as sardas a chamarem-me para um abraço de despedida. Liguei-te no dia seguinte e não atendeste, acho que foi aí que percebi que há coisas que não podemos perder, um último beijo, um olhar que diz adeus com carinho, os nossos corpos  unidos com cada pedaço de pele a despedir-se do outro,

- Adeus!

num final de sabor agridoce, que te fechasse numa pelicula qualquer e te impedisse de andares por aí como mais um espirito à solta.

4 comentários:

Borboleta com Asas disse...

Gosto dos teus textos, sempre gostei
Sei que vais ser escritor...para uma vida...
Parabéns

[anna] disse...

superas-te a cada palavra!nice one!

Rita disse...

O adeus é quase sempre anunciado...nós é que, por vezesm evitamos ver os sinais.

Andreia Mariana F. disse...

Não tenho muita moral para falar, não sou tão adulta quanto isso, nem idade para comprar uma cerveja tenho, mas já disse 'adeus'. Uma, duas, três vezes.
Lembro-me especialmente do último 'adeus' que a minha voz pronunciou.
Estava tudo bem, estava tudo óptimo e sempre pensei que fosse continuar assim, até um dia.
Aquele dia, pensava eu, seria como qualquer outro. Bem, qualquer outro não porque havia uma distância que nos separava e aquele ia ser dos dias em que nos encontramos. Era uma Quarta-feira e o céu que se estendia pela cidade do Porto encontrava-se nublado. E eu estava a caminhar para casa. Caminhava determinada e com uma certa pressa porque a pessoa mais especial da minha vida até aquele momento estava à porta do meu prédio, à espera que eu chegasse. E eu não sabia bem o que esperar. Sim, porque não sabia bem que atitude deveria tomar. Mas continuei a andar, porque me pareceu o mais correcto. Até que cheguei e olhei os olhos azuis mais bonitos que alguma vez vira. E o meu coração tomou o meu corpo inteiro, então entreguei-me aos seus braços, com um 'amo-te' de saudação.
Fechei os olhos, e esqueci a dor. Não por mim, nem por ninguém senão aquela pessoa, que me envolvia num longo abraço, que iria sofrer como ninguém, devido ao amor incondicional que sentia por mim.
- Queres subir?
- Claro.
E subimos. Entramos, fechamos a porta, entramos no quarto, e deixei-me levar mais uma vez. Não devia, admito. Mas sou fria, cruel e egoísta.
Nem um banho me fez sentir melhor, nem aquela água toda pareceu lavar-me a mente, sim, porque o coração não se lava num simples banho rápido.
E tudo continuava na mesma até eu ser eu mesma. Fria, cruel, egoísta e sincera.
- Não dá, adeus.
- Pensei que me amavas.
- Também eu.


E o que aprendi com isto tudo, foi que não há uma maneira de dizer 'adeus'. Diz-se e pronto. Mas há que admitir que muitas das vezes arrependemo-nos. Lamento que não seja o meu caso. Mas de todos os 'adeus' que já disse, poucos foram os sinceros.