quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Benfica



Sou Benfiquista e guardo comigo as alegrias das vitórias e a dor das derrotas de que me lembro. Por vezes dou comigo a cantar o hino e, quer ganhemos, quer percamos, sinto orgulho em pertencer a tudo aquilo que é esse invulgar clube.
Ainda me lembro, por entre imagens fotográficas, da primeira vez que fui ao estádio da Luz ver o Benfica. Foi num Benfica-Porto em que ganhámos 2-1. Ficámos no 3º anel no inicio de uma das 4 curvas que envolviam o relvado da antiga Luz e desde aí não mais fui o mesmo. Dizem que somos 6 milhões, mas não é isso que nos faz grandes, o que nos faz um clube diferente de qualquer outro, é a forma como um Benfiquista vive o seu clube, como sente e transmite o seu amor e o seu desejo de vitória. Não sei se já foram ver um jogo do Benfica, se não foram experimentem, porque deveria ser algo obrigatório para qualquer ser humano, independentemente do clube que apoia. Ali cada Benfiquista é um amigo, cada um solidário com a dor do outro, as alegrias essas, vivem-se numa euforia contagiante e com isso o vizinho do lado, um perfeito desconhecido minutos antes, pode ser o amigo que abraçamos no festejo de mais um golo do Benfica. Já vivi todo o tipo de sentimentos na Luz, desde uma dor revoltante debaixo de chuva nos 0-5 que o Porto nos deu na nossa casa, aos parabéns cantados por 120 mil ao Rui Costa no dia em que jogámos com o Parma ou os festejos do titulo de campeão a altas horas da madrugada. Já passeei pelo relvado no dia a seguir à morte do Fehér para lá deixar o meu cachecol e já me sentei naquele mágico banco de suplentes. Já vi malucos de toda a espécie e as cenas mais bizarras nos dias de jogo e sei por isso, que se o Kusturica cá viesse ver um jogo, tomaria imediatamente a decisão de fazer um filme sobre um grupo de adeptos do meu clube.
Passámos por uma fase má, é verdade, mas o Benfica é eterno e agora parece-me que estamos a regressar em grande. Não nos peçam para não entrarmos em euforia, porque é isso que faz a nossa força, é isso que faz a nossa energia chegar aos jogadores e que nos torna a todos no 12º jogador mais forte nos 4 cantos do mundo.
Esta segunda fui ao estádio e, talvez daí venha a minha esperança, porque vivi o ambiente e a energia que criámos ali, algo mágico e único garanto-vos eu.
Não gosto de coisas sombrias e sujas e talvez por isso abomine o Porto, assim como não gosto de coisas comedidas e talvez por isso nunca pudesse ser do Sporting, sou do Benfica e ao sê-lo sou melhor pessoa, sou mais humano e mais sensível à diferença, vivo as coisas intensamente e admiro aquilo que é único e singular.
Ser do Benfica, deveria ser aliás receita médica obrigatória aquando do nascimento de qualquer bebé, mas ser Benfiquista é coisa que não se ensina, ou nascemos assim ou nunca seremos de facto capazes de o ser.
Não interessa se goleamos, não interessa se ganhamos ou perdemos, se bem que com isso o país sofra também, o que conta de facto é que continuemos a ser assim, autênticos e por isso únicos.
Viva o Benfica!

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Nem que seja por escrito

À terça parece que andamos por obrigação da condição em que nos encontramos. A semana já começou e agora é aguentar até à próxima sexta à noite. Passada a fase eleitoral, que por norma assisto como se de um mundial de futebol se tratasse, deslizamos agora suavemente até ao findar de um novo ano e início de um outro que sempre me fascinou. 2010 e uma nova década. Lembram-se de quando pensavam em 2010 nos anos 80 e 90? Uma desilusão! Não há robots, não há carros voadores, nem nos vestimos de fatos completos de lycra, com estampados geométricos. Não habitamos a lua, não temos naves espaciais dignas desse nome e continuamos a andar de ganga. Como será em 2030? Continuará Portugal bem classificado na lista de países com maior desigualdade social? Onde estarei eu em 2030? Quem serei eu? Que farei nessa altura? Nestes dias, um novo apelo começa a despontar em mim. Não é nada paternal, desenganem-se, mas começo a achar que devo tentar participar um dia no campeonato do mundo de futebol. Não gosto do formato actual, nem dos seus poucos ideais e, talvez por isso não me apeteça ficar só a ver. Como conseguimos afinal mudar algo de que gostamos tanto e que julgamos estar mal, se ficamos apenas a assistir? Esta questão é no fundo, a génese de toda esta minha problemática existencial. Como toda a boa questão existencial, esta terá de ser pensada, repensada e analisada de fora com recurso a amigos. Às vezes, parece que estou para aqui a escrever para ninguém, a escrever apenas para mim e em boa parte isso é verdade. Aqui sinto-me tão bem comigo que tudo fica mais claro, que tudo fica mais simples e desanuviado. Comigo sempre foi assim, sempre me expressei melhor por escrito do que forma oral, não que tenha algum problema na articulação de palavras, talvez esteja mais relacionado com a timidez do que com o facto de ser um discreto sopinha de massa. Em relação ao campeonato do mundo em que quero participar, apenas vos peço que me avisem se mudar, se me tornar noutra pessoa que vocês não apreciem da mesma forma, eu, garanto-vos que também vos vou avisando, nem que seja por escrito.

terça-feira, 6 de outubro de 2009

A sala de espera

À minha frente, uma senhora loura dorme com a parede como almofada, braços cruzados a prenderem a mala que jaz no colo, que isto já nem nos hospitais se está seguro.
Três filas de cadeiras desalinhadas, onde deveriam caber apenas duas, numa sala que me parece um velório sob luz fluorescente. Aqui todos falam em sussurro, excepto um senhor que acabou de chegar, carregado com sacos de plástico. A mulher que o acompanha traz uma ligadura, um género de renda à volta da cabeça com um penso de lado que lhe tapa parte da orelha.
Santa Maria é um bom exemplo do estado da saúde em Portugal, está mal, mas à força das pessoas lá vai funcionando.
Hoje era suposto escrever sobre política (dadas as circunstâncias), mas não me apetece nada e além disso, a saúde é mais importante.
Trouxe uma revista, mas a minha acompanhada apoderou-se dela e lê entusiasmada um texto sobre o estranho comportamento da 1ª dama japonesa.
- Vou ao carro buscar uma caneta e uma folha, e, quando volto já ela se apoderara do assunto. Eu compreendo-a, afinal aqui tudo serve para ajudar a passar o tempo, excepto esperar. Ouvir as conversas dos outros, é também uma boa forma de passar o tempo na sala de espera. A senhora da ligadura não pára de suspirar, o marido sentado na fila da frente, continua virado para trás. Afinal não falava alto porque estava cansado, mas porque tem um defeito na fala. Quando voltei da caneta, olhou-me com um estranho ar esgaziado...
Ao seu lado um casal de velhotes conversa, provavelmente já ouvem mal, porque falam num tom muito superior ao normal. Falam de uma sobrinha que ao que parece se vai casar, não me parecem nada doentes, serão acompanhantes de alguém como eu?
Eu aqui estou, ao canto já com a revista ao colo a servir de base à folha onde escrevo. A minha acompanhada entretanto já entrou e espero que já esteja a sair, que eu suspeito que se aqui fico mais tempo, saio daqui doente e amanhã estou de volta.
A senhora loura à minha frente continua a dormir e eu aproveito para ouvir as conversas dos outros. Há pessoas estranhas...