segunda-feira, 26 de julho de 2010

Meias viagens


É hora de falar de vida, de coisas por fazer, de coisas que já fizemos, de amores que já vivemos, do amor que ainda vamos viver, da terra, do mar, do céu, do pó a que estamos destinados a voltar, numa forma ou noutra, não sabemos, nunca sabemos. Coisas que acontecem, pequenas, grandes, todas diferentes para tantos outros olhares diferentes, de tantos outros ângulos possíveis de ver a mesma coisa. Nunca vamos esquecer os velhos ou novos que perdemos, pelo menos não os que nos alimentaram da ilusão de que as pessoas boas vivem mais tempo e que principalmente, vivem melhor.
E eu aqui, depois de tanta coisa que me aconteceu desde o último post que escrevi. A uns dias de partir em viagem, as coisas parece que se dispersam no ar e surgem de novo quando reparamos que ainda cá estamos. Assuntos que queremos deixar resolvidos, vacinas para pôr em dia, tratamentos às costas que entretanto se desmancharam durante o sono, pesquisas de sítios para dormir, de transportes baratos, dicas que queremos guardar e não conseguimos, projecções antecipadas dos sítios onde vamos estar, e os dias passam assim a muito custo, numa contagem decrescente que a esforço se vai evitando.

- Tenho um feeling que amanhã embarcamos!

Eu também tenho, mas não quero dizer senão depois custa mais. A merda de situações em que eu me meto. À minha frente um candeeiro aceso ilumina a mesa onde pouso o caderno no qual me vejo obrigado a escrever, logo agora que tinha decidido tirar férias disto também. São 2 da manhã em Zurique e eu não quero ir dormir com este corropio dentro de mim. Escrever foi coisa que nunca me deu sono, mas tu já dormes e eu tenho qualquer coisa para arrancar cá de dentro.

- Vais pôr o despertador para que horas?

- Lá para as 8 horas daqui...

Sinceramente acho que nem preciso de despertador, mas é melhor pôr à mesma porque senão é que não durmo mesmo.
Amanhã tentamos de novo embarcar e enquanto isso, aproveitamos para conhecer melhor Zurique, de mochila às costas, agora ainda mais desmanchadas. Cheira-me que ainda vai dar para fazer amigos e dar umas braçadas no canal do rio Limmat com umas cervejas pelo meio.

- Pelo menos conhecemos mais uma cidade...

- Para mim já valeu a pena!

As pessoas mudam, será que as terras também? Ficamos presos às imagens que guardamos, são a nossa vida toda e de certeza que mudam ao longo do tempo. Podemos guardar imagens de coisas que inventámos desses sítios, cirurgias estéticas das recordações visuais que as tornam mais interessantes, que nos tornam mais interessantes. Somos o que vivemos e enquanto vivemos vamos sendo, cada vez mais nós, cada vez mais próximos do que somos suposto ser. Ou não é suposto nada e apenas vamos sendo o que vivemos sem que isso nada acrescente de novo à nossa essência.

- Se eu pudesse passava a vida a viajar!

Se eu pudesse escolhia ser feliz sem meias felicidades, sem meias verdades de bases defeituosas, meias certezas, amores ao meio, viagens pela metade, histórias contadas em duas mãos, de sorrisos escondidos e lágrimas fingidas.
Ficamos assim e cá para mim, se puder escolher só quero ser eu e logo se vê o que acontece.

terça-feira, 6 de julho de 2010

A morte saiu à rua

No passado Domingo, infelizmente, tive uma notícia que me deixou muito abalado. Sem saber explicar estive muito mal-humorado na noite anterior, e mesmo a noite de sono não me deixou com melhores modos. Pensava eu que era cansaço ou mais uma daqueles momentos em que me apetecia ter o Mundo só para mim, talvez fosse, não sei…

O meu telemóvel tocou duas vezes, e em seguida como não atendi, tocou mais duas o do trabalho, o que sendo Sábado já não a agoirava boa coisa. Ligo de volta e do outro lado uma voz que me é muito querida, dá-me a notícia:

- Morreu o Velho Peniche, e o funeral é hoje às 18 horas.

"Velho Peniche", era deste modo que o tratávamos lá por casa, pois isto de ser mais velho deve ser um orgulho e não um defeito. E neste caso, era realmente sempre com muito carinho que falávamos dele.

Pelo que me contaram já à alguns dias que estava num Hospital em Lisboa, muito debilitado. Nessa altura fiquei muito irritado, como é possível não ter sabido disso? Aqui tão perto de mim e eu não o fui visitar, dar-lhe um pouco de apoio, ou simplesmente cumprimenta-lo… e eu que não o via há tanto tempo…

O Velho Peniche, sem eu saber explicar porquê, sempre foi uma figura muito importante para mim, aliás saber sei, mas é estranho como é que algumas pessoas nos marcam tanto durante a nossa vida. Ele foi sem dúvida uma figura incontornável no meu crescimento, sempre com o seu ar sereno, figura esbelta e bem composta, desde muito novo me habituei a vê-lo à porta da Piscina ou a passar nas ruas de Sines, sempre com uma voz calma e um olhar que nos transmitia uma serenidade e uma noção de cidadania espantosa.

Aí está alguém que partiu cedo demais. Pode haver quem diga que já tinha idade para deixar o nosso mundo, que já tinha feito a sua parte, que já tinha deixado o seu legado, é bem verdade, mas de qualquer modo, algumas pessoas deviam ficar connosco só mais um bocadinho, pois têm ainda muito para nos ensinar e para dar.

Sr. Peniche… não me lembro da última vez que o vi, e muito menos do que falámos, mas tenho a certeza de que será mais uma daquelas pessoas que quando chegar o meu dia, e espero que ainda demore, pois tenho muito para fazer, vai lá estar onde quer que seja para me receber:

- Bem-vindo, não tenhas medo que isto até é bom!

E nessa altura, tal como acontecia sempre que o via, percebo que com calma e paciência tudo é levado a bom porto!