quinta-feira, 15 de abril de 2010

De Sines

Já foi terra que deu muita e boa uva, mas hoje, parece que a parra cobre a cepa e não deixa a uva crescer.
E tudo fica na mesma, porque para podar não parece haver ninguém e os que dizem que o fazem, foram mal ensinados.
Mas não é de cepas nem de uvas que vive a nossa terra (sinto-a sempre mais minha quando estou com ela), é de mar e de peixe e do corpo de muitos.
Não sei se seria capaz de voltar a estar em Sines a tempo inteiro, pelo menos assim, com ela perdida e abandonada, refém do conformismo de alguns, presa pelo hábito de outros que lhe trazem tão pouca alegria. O sol brilha e ilumina-a e ela é sempre bonita, mesmo com as ruas moribundas e as encostas mal aparadas, mas são as pessoas que a fazem, são elas que lhe dão vida e ela vive tão pouco hoje em dia. Chega a dar dó um sitio assim tão mal acompanhado. Para os que querem ou podem é mais fácil sair e visitá-la de vez em quando, para os que ficam é mais fácil fechar os olhos e tomar como dela os defeitos de outros, no fundo, somos todos culpados.
Os capatazes que a regem, esses, vão de mal a pior. Antigamente vestiam-se de vermelho, contra tudo e contra todos, sem perceberem que contra ela também. Hoje um grupo de gente sem ideais, à mercê de um homem que vira para onde quer que o vento sopre, parecendo agora soprar para outros que de honra e de palavra nada parecem saber.
O presente nada de bom augura para o seu futuro, salvo raras excepções e pequenas pérolas que a destacam pontualmente das outras terras. Mas nada ganhamos com o pessimismo, por isso eu deixo-o para trás, porque escrevo numa dessas excepções, quem sabe uma pérola, sem saber o que fiz para merecer fazer parte dela. Vejo-a como um apeadeiro no qual já não passam comboios e que agora serve de palco aos que não têm voz e precisam de falar e ao que parece, até os seres mais inesperados a ela recorrem em altura de desespero. E ela aceita todos, de braços abertos e sorriso na cara, tal como a terra onde nasceu, erguida de frente para o mar, nas suas artérias sinuosas em que se perdeu, mas nas quais sei que se voltará a encontrar.

no "estação de sines" por Bruno Leal

1 comentário:

Borboleta com Asas disse...

Muito bem escrito, o teu texto, e ainda mais o que representa nestes dias que passam,os capatazes como tu chamas é de todo uma palavra forte e que para quem a entende como eu eu que vivo no Alentejo , bem no ponto...bem no centro onde tudo aconteceu no acordar de Abril...
Hoje falamos das mesmas coisas com palavras diferentes.
Gosto de tudo o que escreves...
Parabéns Bruno