terça-feira, 6 de outubro de 2009

A sala de espera

À minha frente, uma senhora loura dorme com a parede como almofada, braços cruzados a prenderem a mala que jaz no colo, que isto já nem nos hospitais se está seguro.
Três filas de cadeiras desalinhadas, onde deveriam caber apenas duas, numa sala que me parece um velório sob luz fluorescente. Aqui todos falam em sussurro, excepto um senhor que acabou de chegar, carregado com sacos de plástico. A mulher que o acompanha traz uma ligadura, um género de renda à volta da cabeça com um penso de lado que lhe tapa parte da orelha.
Santa Maria é um bom exemplo do estado da saúde em Portugal, está mal, mas à força das pessoas lá vai funcionando.
Hoje era suposto escrever sobre política (dadas as circunstâncias), mas não me apetece nada e além disso, a saúde é mais importante.
Trouxe uma revista, mas a minha acompanhada apoderou-se dela e lê entusiasmada um texto sobre o estranho comportamento da 1ª dama japonesa.
- Vou ao carro buscar uma caneta e uma folha, e, quando volto já ela se apoderara do assunto. Eu compreendo-a, afinal aqui tudo serve para ajudar a passar o tempo, excepto esperar. Ouvir as conversas dos outros, é também uma boa forma de passar o tempo na sala de espera. A senhora da ligadura não pára de suspirar, o marido sentado na fila da frente, continua virado para trás. Afinal não falava alto porque estava cansado, mas porque tem um defeito na fala. Quando voltei da caneta, olhou-me com um estranho ar esgaziado...
Ao seu lado um casal de velhotes conversa, provavelmente já ouvem mal, porque falam num tom muito superior ao normal. Falam de uma sobrinha que ao que parece se vai casar, não me parecem nada doentes, serão acompanhantes de alguém como eu?
Eu aqui estou, ao canto já com a revista ao colo a servir de base à folha onde escrevo. A minha acompanhada entretanto já entrou e espero que já esteja a sair, que eu suspeito que se aqui fico mais tempo, saio daqui doente e amanhã estou de volta.
A senhora loura à minha frente continua a dormir e eu aproveito para ouvir as conversas dos outros. Há pessoas estranhas...

2 comentários:

Carapinha disse...

Sim sr, parece o António Lobo Antunes este jovem. Com muitas diferenças no estilo mas a fazer-me lembrar a suas introspecções do seu quotidiano...

Bruno Leal disse...

No estilo, na qualidade e noutas coisas que não posso dizer.